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segunda-feira, 26 de julho de 2010

Deus chama ao amor


O ser humano é criado e vocacionado para amar e ser amado. Deus é a Fonte do amor, porque “Deus é amor” (1Jo 4,8.16). Ele ama primeiro. Ele nos capacita para amar e nos deixar amar. Ele deixa Sua marca de amor impressa em nosso ser que suscita, em nós, o desejo e a necessidade de amar e ser amado. A nossa vida, nascida de Deus (cf. 1Jo 4,7), é envolvida e acalentada no abraço carinhoso do próprio Deus.
O dom do amor encontra-se inscrito em nossa natureza humana como uma lei ou uma ordem interna, que nos é dado de graça, para vivê-lo e compartilhá-lo na gratuidade. Deus é fiel no Seu amor. Jamais retira a Sua benevolência e ternura em relação à nossa vida. Da nossa parte, podemos ser infiéis e não corresponder à fidelidade amorosa de Deus. Deus, em Sua fidelidade, nos sustenta e nos envolve em Seu amor. Ele nos capacita a correspondermos ao Seu amor.
A vocação ao amor nasce da circulação de amor entre as pessoas da Trindade, isto é, do contínuo fluxo de Amor entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. À luz desta relação, podemos entender que somos criados para amar e comunicar o amor da Trindade, derramado em nosso coração pela ação do Espírito Santo (cf. Rm 5,5).
Na raiz da nossa vida, trazemos impressa a “marca” ou o “selo” do amor de Deus. A nossa vida é “marca registrada” de Deus. Desta “marca” do amor flui o mandamento do amor. Viver este mandamento é ser fiel ao amor e à vontade de Deus e, simultaneamente, ser fiel à própria lei inscrita em nossa natureza humana. Somos vocacionados ao amor. A vivência e a experiência do amor colocam-nos em sintonia com a lei interna de amar e ser amado. Trata-se de uma fidelidade à lei inata ao amor.
A Fonte do Amor nos atrai e suscita, em nós, o constante desejo de amar e de sermos amados. É este desejo de amar e ser amado que nos dinamiza e nos coloca em movimento, movendo-nos internamente ao Amor. Gera uma atitude criativa, em nós, de buscarmos e deixarmo-nos alcançar pelo amor. Enquanto a nossa vida não se sente correspondida no amor, sentimo-nos frustrados e insatisfeitos; o mesmo acontece quando nos desviamos da Fonte do amor. Tal insatisfação e frustração tendem a gerar seqüelas negativas nas relações fraternas e na vivência da lei interna do amor. Afeta, pois, a vivência do Projeto de Deus em relação à própria vida e missão. Porque somos vocacionados a viver o Plano de Amor que o próprio Deus deseja realizar em nós e pela nossa mediação. Esta infidelidade ao Plano de Deus implica na infidelidade à própria natureza que traz inscrita, em si, a lei do amor. Tal infidelidade pode ser uma entre as várias razões que geram as múltiplas formas de insatisfações ou vazios existenciais, como, por exemplo, a falta de sentido e meta para a vida, falsas seguranças, o sentir-se inadequado consigo e com os outros, acomodações, resignações, cansaço vital, saturação nas relações fraternas, intolerância, impaciência, anemia espiritual, desencantamento com a vida e missão...
O amor traz implicitamente a exigência relacional da vida, porque somos seres relacionais por natureza. Quando quebramos os laços filiais, fraternos e de aliança no amor, então nos privamos da seiva do amor oriunda da Fonte divina e fraterna. Ocorre uma ruptura no e com o vínculo original do amor. Neste caso, o plano original da nossa vida, como criatura amada de Deus, perde sua referência original. Assim, rasuramos a nossa imagem e semelhança com a Trindade; obstruímos a circulação de vida e amor na própria vida e em relação com a presença da Trindade que realiza em nós o Seu querer e agir (cf. Fl 2,13); perdemos a conexão de amor com as pessoas com as quais convivemos; além disso, no profundo do próprio ser, a pessoa perde a conexão consigo mesma. Assim, perdemos o foco da sintonia com Deus, com o próximo e com o nosso centro vital. Podemos passar a vida inteira vivendo distantes de tudo e de todos, ilhados em nós mesmos. Neste caso, viveremos um engano, uma cegueira ou surdez existencial e vocacional de base, vivendo uma mentira e uma cegueira, ou uma insensibilidade para com Deus, com o outro e, enfim, consigo mesmo.
Em contrapartida, é bom lembrarmo-nos que, como batizados, nossa vida é enxertada em Cristo Jesus, o Filho amado do Pai. Ele é a verdadeira videira e nós os ramos. Recebemos a seiva da vida e a energia vital do Cristo-Videira. Ele alimenta e sustenta a nossa vocação ao amor e faz frutificá-la pela nossa resposta generosa ao amor recebido, acolhido e compartilhado. “Como meu Pai me ama, assim também eu vos amo. Permanecei no meu amor” (Jo 15,9). Jesus segue dizendo: “Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos. (...) O que vos mando é que vos ameis uns aos outros” (Jo 15,12.17).
Outros exemplos, onde Jesus revela que o amor é o critério central da vida e missão é o diálogo com Pedro ao confirmá-lo no pastoreio da Igreja. Jesus dirige uma única pergunta a Pedro: “Tu me amas mais que a estes?” Repete-a por três vezes. Sinal que a pergunta pelo amor é decisiva em nossa vida. O amor torna-se o critério de orientação e de ação no seguimento de Jesus.
São Paulo, no seu Hino ao Amor/Caridade (1Cor 13), confirma a centralidade do amor caridade na vida cristã. O amor permanece e dá sentido transcendente a tudo, pois, sua fonte encontra-se no coração da Trindade. É a sintonia com a Fonte do Amor que nos permite beber e permear o nosso testemunho de vida e os nossos gestos e ações deste amor que lhes confere um sabor de eternidade.
Na dimensão do perdão, Jesus ensina que “quem muito ama, muito é perdoado” (cf. Lc 7,47). Neste exemplo percebemos que Jesus insiste que o amor é força que transforma e tudo perdoa, recriando a vida. O perdão é expressão de amor que vai além do simples ato falho ou do comportamento inadequado. Resgata a “herança” dispersada, devolvendo a liberdade e a dignidade de filho/filha e de irmão/irmã.
“Deus é amor; quem permanece no amor, permanece em Deus, e Deus permanece nele” (1Jo 4,16). Em base desta afirmação, podemos dizer que a vida nasce do Amor e traz consigo a marca do amor. A vida nasce do transbordamento do amor de Deus. À luz desta ótica, é possível entender que o ser humano é vocacionado e chamado ao amor. Viver o amor, viver no amor e ser fiel à lei do amor é algo essencial e fundamental na vida humana. Desta forma, é possível entender o dito de Santo Agostinho: “ame e faça o que quiseres”! “Tudo passa, o amor permanece” (1Cor13,13).

Pe. Pius Sidegum, SJ.

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